Sucessores espirituais! Jogos clássicos reencarnados


Um caso comum não só na industria de jogos, é um criador desenvolver uma obra de ficção divertida com personagens interessantes, uma narrativa sólida e tudo mais. Trabalhando para uma empresa grande, sua obra é capaz de alcançar um público grande e aquilo acaba se tornando algo maior do que o seu criador. De repente, a ideia não é mais só sua… a empresa chama mais pessoas para trabalharem em seu projeto, inventando sequências e outras obras derivadas da mesma. O que esse criador imaginava para a sua história, acaba seguindo um rumo inesperado, longe de seu agrado. Cansado, ele decide se demitir. Porém, ao fazer isso, ele acaba de, definitivamente, perder o controle de sua obra. É a empresa quem retém os direitos de tal, livre para usá-la de acordo com os interesses da companhia.

Mas talvez nem tudo esteja perdido para esse criador. Ele pode recomeçar, retomar o controle de seus próprios frutos criativos e devolver aos seus fãs o que lhe foi tirado. É assim que nascem as obras conhecidas como “sucessoras espirituais”.

Okay, nem todas as histórias de sucessores espirituais, ou “sequências espirituais”, aconteceram dessa forma. Mas esse é somente um de muitos exemplos. Mas afinal, o que são esses sucessores espirituais?

Imagens de Dark Souls, série de sucessores espirituais de <i>Demon's Souls</i>
Demon’s Souls e seu sucessor espiritual mais popular, Dark Souls

No reino dos jogos eletrônicos, podemos considerar jogos sucessores espirituais aqueles que compartilham o mesmo “espírito” de um outro jogo que veio antes. Essa conexão pode surgir simplesmente por fãs notarem semelhanças, e muitas vezes isso ocorre devido aos desenvolvedores desse jogo antecessor estarem trabalhando no novo. Como dito na “historinha” do início deste artigo, às vezes esses desenvolvedores saíram de um estúdio e continuaram seu trabalho em um outro, simplesmente mudando o título do jogo e múltiplos aspectos para torná-lo um jogo diferente, mas ainda assim com o mesmo “DNA”.

Dark Souls é um exemplo, sendo um sucessor de Demon’s Souls, apesar de ambos os títulos terem sido feitos pelo mesmo estúdio, a FromSoftware. Ambos os jogos apresentam uma estética e jogabilidade extremamente semelhantes. Então, por quê Dark Souls não é simplesmente “Demon’s Souls 2″? Bem, o estúdio simplesmente queria lançar o segundo Souls para plataformas além do PlayStation 3 da Sony, a dona dos direitos da propriedade intelectual Demon’s Souls. Em outras palavras, a dona da marca. Tudo que o estúdio precisou fazer foi mudar o título, simples assim.

Existem muitos outros jogos que podem ser considerados “sucessores espirituais”, com vários motivos para seus desenvolvedores tê-los criado. Hoje vamos dar uma olhada em alguns desses títulos que talvez você nem sabia que eram “irmãos” de jogos famosos.
Imagem exibindo personagens de jogos da Clover Studio ao lado de outros de sucessores espirituais da PlatinumGames

Clover Studio & PlatinumGames

Em 2004, por volta do lançamento de Viewtiful Joe 2, a Capcom transformou a equipe do jogo na Clover Studio, um estúdio de desenvolvimento independente permitindo que grandes mentes como as de Hideki Kamiya (criador de Devil May Cry) e Shinji Mikami (criador de Resident Evil) pudessem trabalhar com grande liberdade criativa. O estúdio viria a produzir somente cinco jogos até seu fechamento em 2007, seguido da demissão de vários desenvolvedores, incluindo o criador de Mega Man, Keiji Inafune, que nem fazia parte da Clover (mais sobre ele daqui a pouco!).

O pessoal da Clover se dividiu, e a maioria foi para um novo estúdio de seu ex-CEO Atsuhi Inaba, a PlatinumGames, hoje em dia bem conhecida por sucessos como Bayonetta, Metal Gear Rising: RevengeanceNieR: Automata. Um de seus maiores criadores, Hideki Kamiya, continuou trazendo títulos que lembram os que o deixaram conhecido. Bayonetta mesmo, por exemplo, apresenta semelhanças ao clássico Devil May Cry e até mesmo o renomado Okami através da transformação de pantera da protagonista epônima. Talvez o mais óbvio sucessor espiritual de jogos antigos de Kamiya, no entanto, seja The Wonderful 101 com seus super-heróis de baixa estatura, cabeças grandes e vestes coloridas lembrando Viewtiful Joe.

Fora dos títulos de Kamiya temos ainda MadWorld que, apesar de ser visualmente distante do jogo God Hand da Clover, traz de volta a violência exagerada e humorística de seu antecessor.

Capa de Kiki Kaikai e um de seus sucessores espirituais, The Legend of Sakuya

Kiki Kaikai Heavenly Guardian

Se você nos acompanha há um tempo, talvez se lembre de quando indicamos o jogo Pocky & Rocky 2 no nosso primeiríssimo #DensetsuIndica. Infelizmente, a série Pocky & Rocky, conhecida no Japão como Kiki Kaikai, encontra-se abandonada, com seu último lançamento oficial tendo ocorrido em 2001 para o GBA com Kiki Kaikai Advance (Pocky & Rocky with Becky). Esse último jogo lançado, no entanto, não foi o último jogo da série a ser desenvolvido.

A desenvolvedora Starfish-SD, em parceria com a Taito (dona de Kiki Kaikai), trabalhou duro no desenvolvimento de um novo título da série para consoles modernos da época. Não só um novo jogo, mas também uma sequência para o primogênito da franquia lançado em 1986, simplesmente intitulado Kiki Kaikai 2. Infelizmente para os desenvolvedores, a venda da Taito para a Square Enix em 2005 significou a perda dos direitos da marca, obrigando a equipe a cancelar o projeto.

Qualquer um de nós ficaria chateado, abatido, desmotivado… mas não Joseph Climber a Starfish-SD! A empresa continuou o desenvolvimento do título, chamando-o agora de Kiki Kai World (nada sutil).

Captura de tela do cancelado Kiki Kai World, um dos sucessores espirituais de Kiki Kaikai
Screenshot de Kiki Kai World

Imaginamos que a Starfish colocou sua cabeça no lugar, percebendo que não poderia se safar com um nome assim, e eventualmente lançou o jogo para Nintendo Wii e PlayStation 2 sobre o título Yukinkoto Daisenpuu: Saiyuki to Koyukino Hie Hie Daisoudou, conhecido na América do Norte como Heavenly Guardian e na Europa pelo menos genérico The Legend of Sakuya. O jogo desta vez seria protagonizado por uma deusa do gelo ao invés de uma sacerdotisa, vestindo branco e azul ao invés do tradicional branco e vermelho. A jogabilidade ainda permaneceu bem remanescente de títulos da série Kiki Kaikai.

Podemos dizer que este foi um sucessor espiritual forçado, já que antes iria mesmo ser uma verdadeira sequência.

Foto de Keiji Inafune, criador do Mega Man e de um de seus sucessores espirituais, Mighty No. 9

Mega Man Mighty No. 9

Oh, por onde começar com isso…?

Como comentamos acima, houve uma época em que vários funcionários da Capcom decidiram deixar a empresa. Entre os motivos citados, muitos deles estavam desconfortáveis com a empresa exigindo que quase 100% de seus novos jogos fossem sequências de títulos populares como Resident EvilDevil May CryOnimusha e outros. Keiji “Inafuking” Inafune, o criador do icônico Mega Man esteve entre esses que saíram, logo fundando seu próprio estúdio: Comcept.

Três anos depois da fundação de seu estúdio, Inafune finalmente revelou, durante o evento Penny Arcade Expo 2013, seu grande projeto: Mighty No. 9, um sucessor espiritual ao clássico Mega Man. Dizer que fãs ficaram empolgados é pouco. Até pouco tempo, desde a saída de Inafune da Capcom e até um pouco antes disso, a franquia do super robô lutador azul encontrava-se um tanto abandonada, com basicamente todos os seus jogos anunciados sendo cancelados. Tantos jogos cancelados que daria para fazer um artigo todo sobre isso, e nós fizemos!

Fãs da franquia estavam implorando por um novo jogo, qualquer coisa que fosse. E se a Capcom não lhes daria, a Comcept de Inafune cuidaria disso. A empresa, ainda pequena, buscou a ajuda do público para fazer seu projeto se tornar realidade através de uma campanha de financiamento público no Kickstarter. Em apenas dois dias, a meta de 900 mil dólares foi alcançada. Até o fim da campanha, mais de 4 milhões de dólares foram arrecadados.

Gif animada de Mighty No. 9, um dos sucessores espirituais de Mega Man

E então… as coisas começaram a complicar. Menos de um ano após a campanha no Kickstarter, a Comcept anunciou planos para uma série animada, e em entrevistas Inafune expressava seu interesse em expandir a futura franquia com filmes live-action e mais. O estúdio voltou ao Kickstarter, pedindo aos seus fãs mais dinheiro para conteúdo bônus como dublagem completa em inglês. Essa não seria a última vez que Mighty No. 9 daria as caras no site, com o estúdio voltando mais tarde no mesmo ano tentando conseguir 198 mil dólares adicionais para uma fase de DLC.

Por fim, Inafune apareceu no Kickstarter com um novo jogo intitulado Red Ash: The Indulible Legend, um sucessor espiritual de Mega Man Legends com personagens de Mighty No. 9. Desta vez a campanha não obteve sucesso, e a empresa chinesa Fuze assumiu o financiamento do jogo.

Gif animada de Mighty No. 9, um dos sucessores espirituais de Mega Man

Após ter sido adiado múltiplas vezes, Mighty No. 9 finalmente foi lançado e não conseguiu impressionar, com seus gráficos insípidos e jogabilidade mediana. O jogo tinha tudo para ser algo de sucesso considerando todo o seu orçamento e o envolvimento da Inti Creates, criadora da série Mega Man Zero e seu sucessor espiritual de sucesso Azure Striker Gunvolt. Felizmente, a Capcom decidiu trazer o herói robótico original de volta com Mega Man 11, marcado para sair mais para o fim do ano.

Imagem de Castlevania: Symphony of the Night e Bloodstained: Ritual of the Night, um de seus sucessores espirituais

Castlevania Bloodstained

Assim como a maioria deste artigo, Castlevania também é uma daquelas franquias cujo a empresa dona, neste caso a Konami, não anda sabendo muito bem o que fazer com ela. Desde os títulos da série Castlevania: Lord of Shadows, não tivemos muitas novidades sobre a franquia. Fãs concordam que para reviver este clássico dos jogos, talvez a Konami devesse olhar de volta para o passado, principalmente os títulos produzidos por Koji Igarashi.

Igarashi trabalhou por muito tempo na franquia, trazendo em sua época os jogos favoritos dos fãs como Symphony of the NightAria of Sorrow e outros. Agora, de forma semelhante a Keiji Inafune com Mighty No. 9, Iga retorna para reviver jogos de plataforma com temática gótica. Em maio de 2015, Bloodstained: Ritual of the Night iniciou sua campanha de financiamento no Kickstarter com uma meta de 500 mil dólares, eventualmente se tornando o jogo que mais arrecadou dinheiro no site com um total de 5,5 milhões de dólares.

Captura de tela em jogo de Bloodstained: Ritual of the Night, um dos sucessores espirituais de Castlevania

Diferente de Mighty No. 9, que serviu de inspiração para a campanha de Bloodstained, o desenvolvimento do jogo aparenta estar progredindo tranquilamente, contando até com a participação de vozes familiares de Castlevania.  Igarashi ocasionalmente providencia atualizações sobre o progresso do título tanto em suas páginas oficias como também curtos vídeos de jogabilidade e vlog no canal de YouTube oficial. Além disso, uma demo foi distribuída para participantes da E3 2016, sendo bem recebida e deixando todos com vontade de mais.

Ritual of the Night será lançado para basicamente todas as plataformas principais atuais: PC, PlayStation 4, PS Vita, Nintendo Switch e Xbox One.

Por fim, é claro, não podemos deixar de mencionar a arte MARAVILHOSA do jogo feita por Yuji Natsume:

Arte de Yuji Natsume de Bloodstained, um dos sucessores espirituais de Castlevania

Existem muitos outros sucessores espirituais, inclusive bem mais antigos dos que os mencionados aqui. O sucesso desses títulos é bem notado, e acaba abrindo caminho para mais e mais saírem. Afinal, somos todos fãs de jogos antigos e sempre tem algum desenvolvedor por aí com vontade de explorar mais esse passado, evoluindo-o e nos mostrando que tal tipo de jogo não morreu, que ainda pode continuar sobre uma nova luz, com novas mecânicas e elementos.

Qual o seu sucessor espiritual favorito e, se você pudesse fazer um de qualquer título, de qual jogo faria? Qual seria o seu antecessor espiritual? Nos conte através de nossa página no Facebook, Twitter ou em nossas comunidades no Telegram ou Discord.

 

Compartilhe:

Like it? Share with your friends!

Qual foi a sua reação?

amei amei
4
amei
haha haha
1
haha
meh... meh...
1
meh...
eita! eita!
1
eita!
Minato

Aspirante a escritor e jornalista. Minato é um amante de jogos, cinema, seriados, histórias em quadrinhos, música e tudo relacionado ao Japão. É uma fábrica de ideias que está sempre produzindo cada vez mais, apesar de não colocar nem metade em prática. Seus jogos favoritos são Persona 3, Okami, Steambot Chronicles, Shin Megami Tensei: Nocturne, Portal 2 e a série Kingdom Hearts.