Fire Emblem Engage | Meu jogo favorito reaquecido no micro-ondas

Um jogo requentado, gelado no meio.


Minha relação com a franquia Fire Emblem começou mais ou menos 15 anos atrás, quando ganhei um Game Boy Advance e mergulhei de cabeça no mundo dos RPGs táticos, especificamente com Binding Blade. Desde então, minha paixão por esse gênero só cresceu e uma das experiências mais marcantes que tive foi alguns anos depois, com Fire Emblem Echoes. Foi nessa época que fui cativado de vez e me transformei em um verdadeiro entusiasta da franquia.

Vale dizer que o buraco foi mais embaixo quando Fire Emblem Heroes foi lançado. O primeiro game gacha da série acabou tomando uma boa parte do meu tempo, principalmente quando fui imerso nos aspectos competitivos do jogo.

Rever e utilizar personagens de diversos games da minha infância em um mesmo jogo foi uma experiência que aumentou minha expectativa pelo próximo capítulo da série principal, o então primeiro jogo da franquia no Switch: Fire Emblem: Three Houses. Minha empolgação pôde ser acompanhada aqui mesmo no site, com diversas matérias especiais sobre ele sendo escritas por mim.

Dessa forma, Heroes e Three Houses foram as fundações para o que pode ter sido um dos maiores hypes que senti por um novo jogo de videogame desde que acreditei na existência de Hollow Knight Silksong. A análise que trago hoje é sobre o jogo que destruiu completamente esse hype, sendo o título que tomou o posto de pior jogo da série para este humilde redator e fã que vos escreve. Estou aqui para expor minhas opiniões sobre Fire Emblem Engage.

Para não dizer que não falei das flores

Fire Emblem Engage entrega muita qualidade quando se trata de design de personagens. Ouso dizer que o game supera até mesmo seu antecessor, Three Houses, que tinha um problema incômodo de manter todos com uniformes iguais por boa parte do jogo, omitindo suas individualidades. Cada personagem em Engage apresenta um visual agradável.

Além do design, a profundidade da escrita dos personagens é outro ponto forte do jogo. Tanto os protagonistas quanto os personagens secundários recebem um tratamento especial, com histórias e desenvolvimento cuidadosamente escritos. Essa qualidade de escrita, que teve seu primeiro grande salto qualitativo em Awakening no 3DS, continua a enriquecer a experiência da história também aqui.

Outro fator que gostaria de mencionar é sobre o nível de dificuldade em comparação com seu antecessor, proporcionando uma experiência mais desafiadora. Diferente de Byleth em Three Houses, que era praticamente uma máquina de matar imparável, Alear, o protagonista de Engage, foi balanceado de forma mais realista.

Assim, até mesmo nas dificuldades mais baixas, o jogo apresenta um certo nível de desafio estratégico. Os jogadores são encorajados a considerarem cuidadosamente suas ações, explorando as habilidades de cada personagem e planejando estrategicamente suas ações em batalha. Alear não vai vencer um confronto contra um exército sozinho como Byleth fazia.

Por fim, encerrando as poucas coisas boas desse jogo, quero falar de algo que nem deveria ser um destaque, mas que em um mundo onde a representação é fundamental, temos que falar o óbvio e elogiar o mínimo.

Fire Emblem Engage é um dos poucos títulos japoneses que joguei e foi capaz de apresentar personagens negros com uma escrita sensível, evitando clichês e piadas de mau gosto. Não são escravos libertos, não é um negro bombado e burro, não é um preto beiçudo “traiçoeiro”. É todo um povo, toda uma cultura tratada com respeito e que têm importância e soberania na história do game.

Essa abordagem é mais do que uma mera exceção; é uma necessidade para que a indústria de jogos continue evoluindo em termos de inclusão e representatividade (estou olhando para você, Persona). Quem sabe um dia não precisemos mais elogiar esse tipo de coisa, mas até lá, parabéns aos envolvidos.

Esses aspectos positivos do jogo, incluindo seu design de personagens, profundidade de elenco, desafio ajustado e representação significativa de personagens negros, tornam o jogo uma experiência notável e digna de ser explorada por fãs antigos e novos jogadores da franquia… Ou é isso que eu diria se o resto do texto não abordasse os inúmeros problemas dele. Vamos ao dragão branco na sala.

Você conhece a síndrome do pato?

O pato voa, nada e anda; mas não faz nenhuma dessas coisas com maestria. Fire Emblem Engage tem tudo que os jogadores mais amam na série (com uma exceção bem específica), mas não consegue implementar nenhuma dessas características de maneira satisfatória.

Um dos problemas que afetam o jogo é a qualidade técnica questionável. Os cenários de batalha são simplórios e, em grande parte, apresentam uma estética genérica com arenas quadradas e poucos detalhes visuais marcantes. Essa falta de variedade pode tornar as batalhas repetitivas e menos envolventes, o que mina completamente o que abordei anteriormente, que é o aspecto positivo do balanceamento.

Além disso, a falta de renderização nos cenários das cenas de história, que são apresentados como imagens estáticas, remete a uma abordagem antiquada, daquelas que lembram jogos do começo do PlayStation 1, sem aproveitar plenamente o potencial artístico do game. A conversinha de que o Switch é um hardware incapaz só faria sentido se vivêssemos em um mundo onde Tears of the Kingdom não existisse; é um cenário estático em um console de 2017.

O game também sofre com outra questão: a quantidade excessiva de personagens jogáveis. Embora possa parecer uma vantagem à primeira vista, essa abundância acaba se tornando um problema. Ocorre que é praticamente impossível utilizar todos os personagens disponíveis de forma consistente ao longo do jogo.

Eu particularmente interpretei essa falha como um medo dos desenvolvedores de que jogadores menos experientes enfrentassem dificuldades no modo clássico, em que é introduzida a mecânica de morte permanente dos personagens. Entretanto, essa situação compromete tanto essa permadeath, que perde todo o seu peso, quanto a experiência de jogadores que optam pelo modo casual, que não conseguem usufruir de todos os heróis em seu grupo.

Infelizmente, ainda tem mais. Um outro problema sério em Fire Emblem Engage é a dificuldade de subir de nível e mudar a classe de um personagem para uma completamente diferente, em comparação com optar por sua evolução natural. O jogo apresenta um desequilíbrio significativo nas batalhas opcionais quando o jogador toma essa decisão, tornando os personagens em treinamento extremamente vulneráveis.

Isso desencoraja a criatividade na formação das unidades e vai contra um dos pontos mais positivos de Fire Emblem: Three Houses (lembram da minha Marianne cavaleira alada?). A falta de um balanceamento adequado entre as batalhas opcionais e o crescimento dos personagens acaba limitando as opções dos jogadores e prejudicando a experiência estratégica do jogo, praticamente anulando o aspecto de balanceamento que elogiei sobre a força de Alear.

No que diz respeito à narrativa, embora o jogo introduza alguns conceitos interessantes, a história principal carece da profundidade presente nas histórias individuais. Apesar das oportunidades de conhecer histórias interessantes dos personagens, a trama da obra em si é rasa e não se aprofunda em praticamente nada. O resultado é uma história que lembra primeiros games da série, que nunca foram conhecidos por sua narrativa.

Boas ideias, mas um jogo para ser esquecido

Fire Emblem Engage, ao introduzir a mecânica dos anéis com espíritos de “grandes heróis” e apresentá-los como personagens de obras anteriores da franquia, claramente buscava explorar o sucesso de Fire Emblem Heroes e expandir o fanservice, transformando isso em uma mecânica de jogo.

Embora seja uma abordagem criativa, infelizmente, essa tentativa empalidece diante dos inúmeros problemas que o game traz consigo. Para mim, como mencionado no início do texto, este é talvez o título que menos gostei em toda a franquia.

É lamentável que um jogo que parecia ter potencial para avançar e inovar depois de seus sucessos recentes tenha sido prejudicado por problemas técnicos, falta de profundidade narrativa e pelas outras questões mencionadas. Como fã da série, espero sinceramente que na próxima entrada da franquia, a desenvolvedora consiga aproveitar os avanços e ideias dessa tentativa, ao mesmo tempo corrigindo os problemas que acompanharam Fire Emblem Engage.

Que a série possa se reinventar e nos brindar com uma experiência que seja verdadeiramente digna do legado e da paixão que os fãs têm por ela. Até lá, finalizo esta review e quando sentir falta de Fire Emblem, Engage estará amargando o último lugar na minha lista de opções.

Pelo menos esse jogo me agraciou com a existência de Yunaka.

Fire Emblem Engage, lançado em 20 de janeiro de 2023, encontra-se disponível mundialmente para Nintendo Switch.

Texto por Willyan Cavalcanti
Revisado por Ãngelo Silva

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Principimi

Estudante de Letras - Japonês na Cruzeiro do Sul; formado em paleografia na oficina Sérgio Buarque de Holanda e em design pela Saga. Prefere jogos narrativos, RPGs ou de ritmo. Atualmente passa horas jogando indies e RPGs no Switch ou sustentando seu vício em gachas de celular. Tem como franquias favoritas Fire Emblem, Pokémon, Persona e Final Fantasy. Enciclopédia humana de Love Live e garota mágica nas horas vagas.